O CARNAVAL EM ANGRA, ANTES DO SISMO DE 1980 / CARNIVAL IN ANGRA, BEFORE THE EARTHQUAKE OF 1980

 Aqui ficam três recordações do Carnaval em Angra, antes do Terramoto do primeiro de Janeiro de 1980.

Quando dizemos - os de antes do sismo - que as coisas eram diferentes é porque eram mesmo. Não é uma questão de saudade ou de incapacidade de perceber que a vida muda, com o correr dos dias. É outra coisa, que costumo descrever como a sensação de ter sido roubado, de repente, sem qualquer hipótese de recuperar o que quer que seja, do que se foi na aragem.

Uma é uma mascara de papelão, feita manualmente, e pintada à mão, quero crer que em Angra. Apanhei-a no meio do entulho, por sorte resguardada da chuva e dos temporais, algum tempo depois do terramoto. 

Estava para ali, esquecida, no meio de tanta tralha partida, no rés do chão do que era o Lawn Ténis Club, considerado como o mais fino de Angra, e que ficava no Alto das Covas, virando para a Recreio dos Artistas, naquilo que é, hoje, o jardim de infância e pré-escola de São Gonçalo. O Lawn Ténis Club e o Clube Musical Angrense eram famosos por competirem entre si, com bailes a preceito, com fantasias e mascarados de grande estilo e música ao vivo, de qualidade.

Com isto que escrevo significo que esta máscara, figurando um ser demoníaco e com dentes de vampiro, é, porventura, das coisas mais antigas, em termos deste tipo de adereços, ainda a resistir ao passar do tempo e olhando-nos do alto dos seus pelo menos 42 anos. Enfiava-se pela cabeça abaixo, garantindo perfeita impunidade ao aprendiz de diabo que estivesse a usá-la.

Máscara de carnaval. Papel colado em camadas, tinta.
Meados do século XX. Açores (Angra do Heroísmo?)

Outra é um molde de barro cozido, para fazer uma cabeça grande. A máscara era feita em duas metades, com pedaços de papel de jornal rasgado, humedecido e fixado, às camadas, com grude, ou seja cola de amido de trigo. Depois de secas, as duas peças era juntas uma à outra, por mais alguns pedaços de jornal colado e deixava-se secar tudo. No fim, era só pintar, com mais ou menos refinamento.

Molde para máscara grande, de carnaval. Barro cozido. 
Meados do século XX. Angra do Heroísmo.

Foi esculpida por meu pai e lembro-me de ver uma ou duas, feitas por ele, acabadas e prontinhas a usar, no meio de um vitrina enfeitada com confettis, serpentinas, e outras coisas de carnaval, numa das vitrinas do Athanásio - sim que o Athanásio participava, com o Grandela, o Pedrinho Amiguinho e a Loja dos Espanhóis, no abastecimentos de materiais para a festa que se desenrolava na Rua da Sé, desde o Sábado Gordo até à Terça Feira. Lembro-me especialmente do piscar de olho brincalhão e do tamanho fora do comum. Uma pessoa via mais facilmente o exterior pelos buracos feitos no nariz...

A última vez que vi uma tal máscara, na vitrina do Athanásio, foi por volta de 1970...

Finalmente, um pequena recordação do que era, por certo, a melhor loja de carnaval de Angra, o Pedrinho Amiguinho.

Nariz e óculo de carnaval. Papel colado em camadas, verga, tinta e cabelo falso
Meados do século XX. Açores (Angra do Heroísmo?) 12X6 cm

É um simples nariz de papelão moldado, com dois arcos de verga, a simular os óculos, e uma imitação de bigode por baixo que, por sinal, fazia umas cócegas do diabo a quem o usava. Cheguei a colocá-la, pelo menos uma vez, num "assalto de carnaval" a casa de pessoa amiga, também antes de 1970. 

Grande ABRAÇO DE CARNAVAL e até para o ano!

-------------

Here are three memories of the Carnival in Angra, before the Earthquake of the first of January 1980.

When we say - those who lived in Angra before the earthquake - that things were different, it is because they were. It is not a matter of longing or inability to perceive that life changes, as the days go by. It is something else, which I usually describe as the feeling of having been stolen, suddenly, without any chance of recovering anything, from what was in the plowing.

One is a mask of cardboard, handmade, and painted by hand, I want to believe that in Angra. I caught it in the middle of the rubble, luckily protected from rain and storms, some time after the earthquake.

It was there, forgotten, in the middle of so much broken stuff, on the ground floor of what was the Lawn Tennis Club, considered to be the finest in Angra, and which was in Alto das Covas, turning to Recreio dos Artistas, in what is today the kindergarten and preschool of Sao Goncalo. The Lawn Ténis Club and Clube Musical Angrense were famous for competing with each other, with dances, with costumes and masks of great style and live music, quality.

With this that I write I mean that this mask, figuring a demonic being and with vampire teeth, is, perhaps, of the oldest things, in terms of this type of props, still resisting the passage of time and looking at us from the top of its at least 42 years. He would stick his head down, guaranteeing perfect impunity for the devil's apprentice who was using it.


Another is a mold of baked clay, to make a large head. The mask was made in two halves, with pieces of torn newsprint, moistened and fixed to the layers with glue, that is, glue from wheat starch. After drying, the two pieces were joined together, for a few more pieces of glued newspaper and everything was allowed to dry. In the end, it was just painting, with more or less refinement.

It was sculpted by my father and I remember seeing one or two, made by him, finished and ready to use, in the middle of a showcase decorated with confetti, streamers, and other carnival stuff, in one of Athanásio's windows - yes, that Athanásio participated, with Grandela, Pedrinho Amiguinho and Loja dos Espanhóis, in the supply of materials for the party that took place in Rua da Sé, from Saturday Gordo until Tuesday. I especially remember the playful wink and the unusual size. A person could see the outside more easily through the holes made in the nose ...

The last time I saw such a mask, in the Athanásio window, was around 1970 ...


Finally, a small reminder of what was, of course, the best carnival store in Angra, Pedrinho Amiguinho.

It is a simple molded cardboard nose, with two lintel bows, simulating the glasses, and an imitation mustache underneath which, by the way, tickled the devil to the wearer. I even put her, at least once, in a "carnival assault" at a friend's house, also before 1970.

Great HUG OF CARNIVAL and until next year!.